O início da ressurreição ou o prolongamento da crise de um histórico
Bruno Nunes e Pedro F. Guerreiro
Lembram-se do Farense? O último emblema algarvio a ter jogado na principal Liga de futebol parece renascer no plano desportivo, mas continua mergulhado numa grave crise financeira
a Depois de 17 épocas consecutivas na Liga, a descida ao segundo escalão na época de 2001/02 marcou o princípio do (quase) fim do Farense.Para o clube que foi um dia o emblema de toda uma região, o início do século XXI teve contornos dramáticos, com a crise financeira e a rocambolesca queda até aos confins do futebol nacional (depois da desistência da participação na Liga de Honra em 2003/04 e a extinção do futebol sénior em 2005/06), uma situação "visível e desgraçada" que António Boronha (ex-presidente do clube e ex-vice-presidente da Federação Portuguesa de Futebol) considera ter ficado a dever-se à tentativa do clube em "ser transparente", contrariando uma tendência que vigorava no futebol português.
Com a Farense Futebol SAD a enfrentar um processo de insolvência, há duas temporadas (2006/07) a direcção do clube decidiu inscrever uma equipa na segunda divisão distrital, como forma de não deixar morrer o futebol sénior. E começou aí a recuperação desportiva do Farense: conseguiram uma vitória no mais baixo escalão do futebol algarvio e a subsequente promoção para a primeira divisão distrital. Esta época, os "Leões de Faro" conseguiram novamente a subida de escalão ao vencerem incontestavelmente a competição em disputa, feito que marca o regresso do emblema às competições nacionais, mais concretamente à terceira divisão.
O futuro, no entanto, continua incerto. Se é verdade que os "sucessos desportivos" parecem aludir aos melhores dias, certo é que a situação financeira não deixa esquecer que o maior obstáculo ao futuro do Farense é o passado. As dívidas e o passivo ascendem a cerca de cinco milhões de euros, valor que só pode ser saldado através da venda do Estádio de São Luís, que, no entanto, ainda não pertence ao clube mas sim à autarquia, segundo explicou o presidente do Farense, Gomes Ferreira, ao PÚBLICO: "O estádio vai ser cedido ao clube para pagar o passivo, se os credores da Farense Futebol SAD acertarem a redução do crédito. O futuro do clube está dependente da venda do estádio."
A solução é consensual: a venda do estádio é a única saída para uma situação que se arrasta há vários anos. "Saí do Farense em 1998 e já antes de sair defendi muito a venda do São Luís, obsoleto e sem condições de segurança, numa altura em que já estava certo o Estádio Algarve", disse Boronha ao PÚBLICO.
O imbróglio financeiro que tem assolado o clube na última década não tira a fé aos adeptos farenses, que continuam a afluir em grande número aos estádios por onde o clube joga, apesar de desabituados das lides dos distritais. Contam-se na casa dos milhares e fazem inveja a muitas assistências da Liga. António Boronha recordou que a massa adepta dos "leões do Algarve" sempre foi conhecida pelo grande fervor clubístico: "Os dirigentes dos "grandes" sabiam o terror que era jogar no São Luís."
Para o director-desportivo António Barão, as elevadas assistências num escalão inferior justificam-se com uma evidência: "O futebol é paixão, é por isso que as gentes de Faro vão atrás do clube. [No jogo] em Vila Real de Santo António, estiveram cinco mil pessoas. No Algarve, o Farense é o clube que tem mais condições para chegar à Liga." Condições de que, para já, António Boronha duvida: "Nos dois últimos anos houve um percurso interessante, mas o clube caiu tão baixo que o percurso até aqui foi relativamente fácil. A dificuldade começa agora. Eu acredito em tudo o que o clube pode voltar a ser, desde que resolvam os constrangimentos de ordem económica."
Gomes Ferreira pensa que a resolução poderá estar para breve: "Acredito que [a situação da venda do estádio e liquidação do passivo] possa estar resolvida ainda este ano. Objectivo? Fazer uma subida sustentada até aos lugares onde o Farense já esteve no passado..."
"O orgulho do Algarve somos nós", cantou-se na bancada
a Em dia de festa, os adeptos do Farense disseram uma vez mais "presente", como aliás dizem quase sempre. Com uma média nos jogos em casa de cerca de milhar e meio de espectadores, esses números rivalizam com as assistências de alguns clubes da Liga. No último jogo da época (sábado) contra o Alvorense - que servia de consagração do Farense como campeão distrital - a única bancada aberta aos adeptos do Estádio do Algarve recebeu duas mil pessoas.Para um membro da claque South Side Boys, Pedro Guerreiro, a paixão que se mantém por aquele emblema é a explicação para o apoio mostrado: "Move-nos o amor ao clube da terra. Quando se está lá em cima é fácil apoiar..." O líder da claque, Rui Roque, alinha pelo mesmo discurso: "A equipa está na distrital, mas só temos esta, temos que apoiá-la, esteja em que situação estiver." O ambiente foi de festa, uma semana depois da despedida do São Luís como palco dos jogos do clube. "Claro que ficam saudades mas prefiro não ter São Luís do que ver o fim do Farense por questões financeiras", declarou Élio Arenga, um adepto.
Também presente no Estádio do Algarve esteve Hassan Nader, ex-jogador e figura carismática do Farense. "Este clube faz parte da minha vida, corre-me no sangue", disse o marroquino, confiante de que o Farense "tem tudo para voltar aos grandes palcos".
Mesmo derrotado por 5-0, até o treinador do Alvorense desejou felicidades ao emblema de Faro. "Que não parem de subir de divisão, porque o Algarve precisa de uma equipa na primeira", desejou Rui Clemente.
O dia terminou com a entrega de prémios e os festejos da subida à terceira Divisão, que poderá marcar, quem sabe, o início da ressurreição do Sporting Clube Farense. B.N.
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