domingo, 6 de julho de 2008

Viagem ao mundo Ultra - Parte 3

Euro 2000 Holanda – Bélgica


“Ao contrário da grande maioria do pessoal que vou conhecer e com quem vou conviver na Holanda e Bélgica, eu sou primeiro português e depois sportinguista.
O resto do pessoal ostenta símbolos e define-se sobretudo como NN e benfiquista ou Juve Leo e sportinguista. Não que eu os condene – aliás, em certos momentos até os invejo. Nos dias que correm não é o local em que vivemos, os bens que possuímos ou mesmo a família que os identifica.
Antes os amigos, sobretudo aqueles com quem partilhamos, de uma forma activa, os interesses comuns.
O futebol e os clubes são os elementos que mais forças mantêm na sociedade portuguesa do ano 2000 – mais do que a política e outros interesses da dita sociedade civil (antes, dos lobbies sócio-económicos e coorporativos que a enformam).
Não é por acaso que vivemos num país em que a politica só chega aos ouvidos dos comuns mortais através de notícias escandalosas e da caricatura inteligente da contra-Informação, que nos demonstra, através de sósias, o ridículo de Guterres, Durão ou Portas.
Nas claques vive-se, pois, uma união e uma camaradagem por vezes mais forte do que os laços familiares e as amizades mais convencionais.

Pela primeira vez irei ficar rouco, quase afónico. Esteve calor durante o dia; à entrada, é proibida a introdução de garrafas de plástico, bebo toda a água que consigo e despejo o resto pela cabeça abaixo. Lá dentro porém, o sol não chega ao sítio onde estou: encharcado, arrisco-me a apanhar uma cosntipação.
Fico sentado perto de lugares de imprensa, por baixo da qual, à minha esquerda se encontram alguns romenos (que suponho VIP). No sector à minha direita estão os portugueses endinheirados – que pagaram vinte contos sem pestanejar – para quem quase tudo parece enfado e contenção. Gente de pouca fé futebolística, provavelmente respeitáveis sócios de clubes nacionais, vão ali pavonear o se estatuto e o seu dinheiro como se estivessem num jantar de gala; fazer-se notados, sorrir, ver e serem vistos pelos seus pares. Sentindo-me completamente deslocado, não terei qualquer pejo em entrar no verdadeiro espírito do jogo, em sinal de abandono da carapaça da indeferença quotidiana: berro, insulto os adversários, praguejo em português vernáculo.
De tal forma que rapidamente se me cola um tipo que, mesmo sem grande experiência nestas coisas, reconheço ser um policia à paisana. ”



in "Viagem ao mundo ultra"

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